14 de fev. de 2011



CHAU NÚMERO TRES

Mario Benedetti


Te dejo con tu vida
tu trabajo
tu gente
con tus puestas de sol
y tus amaneceres.

Sembrando tu confianza
te dejo junto al mundo
derrotando imposibles
segura sin seguro.

Te dejo frente al mar
descifrándote sola
sin mi pregunta a ciegas
sin mi respuesta rota.

Te dejo sin mis dudas
pobres y malheridas
sin mis inmadureces
sin mi veteranía.

Pero tampoco creas
a pie juntillas todo
no creas nunca creas
este falso abandono.

Estaré donde menos
lo esperes
por ejemplo
en un árbol añoso
de oscuros cabeceos.

Estaré en un lejano
horizonte sin horas
en la huella del tacto
en tu sombra y mi sombra.

Estaré repartido
en cuatro o cinco pibes
de esos que vos mirás
y enseguida te siguen.

Y ojalá pueda estar
de tu sueño en la red
esperando tus ojos
y mirándote.


© Mario Benedetti
In, Poemas de otros (1973-1974)
 e In, El amor, las mujeres y la vida (1995)

Copyright © Mario Benedetti, 1995 
c/o Guillermo Schavelzon & Asoc. Agencia Literaria


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ADEUS NÚMERO 3

Deixo-te com tua vida
teu trabalho
tua gente
com teus pores-do-sol
e teus amanheceres.

Semeando tua confiança
deixo-te junto ao mundo
derrotando impossíveis
segura sem seguro.

Deixo-te frente ao mar
decifrando-te a sós
sem minha pergunta às cegas
sem minha resposta rota.

Deixo-te sem minhas dúvidas
pobres e mutiladas
sem minha imaturidade
sem minha veteranice.

Mas também não creias
de pés juntos em tudo
não creias nunca creias
neste falso abandono.

Estarei onde menos
esperares
por exemplo
numa árvore anciã
de obscuros cabeceios.

Estarei num distante
horizonte sem horas
na marca do tato
em tua sombra e minha sombra.

Estarei repartido
em quatro ou cinco meninos
desses para quem olhas
e em seguida te seguem.

E tomara possa estar
de teus sonhos na trama
esperando teus olhos
e te olhando.


Tradução de © Celina Portocarrero
Considero pessoalmente essa a melhor tradução

Mario Benedetti (Paso de los Toros, 14 de setembro de 1920 — Montevidéu, 17 de maio de 2009) foi um poeta, escritor e ensaísta uruguaio. Integrante da Geração de 45, a qual pertencem também Idea Vilariño e Juan Carlos Onetti, entre outros. Considerado um dos principais autores uruguaios, ele iniciou a carreira literária em 1949 e ficou famoso em 1956, ao publicar "Poemas de Oficina", uma de suas obras mais conhecidas. Benedetti escreveu mais de 80 livros de poesia, romances, contos e ensaios, assim como roteiros para cinema.


9 de fev. de 2011



(Livre Adaptação do texto
original de Ricardo Gondim)

TEMPO QUE FOGE!


Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver 
daqui para frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquele 
menino que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ele 
chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. 
Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir 
quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos.
Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos 
para reverter a miséria do mundo. Não quero que me convidem 
para eventos de um fim de semana com a proposta de abalar o milênio.

Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir
estatutos, normas, procedimentos e regimentos internos.  
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, 
que apesar da idade cronológica, são imaturos.

Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões
de 'confrontação', onde 'tiramos fatos a limpo'. 
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo 
majestoso cargo de secretário geral do coral.
Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: “as pessoas 
não debatem conteúdos, apenas os rótulos”. 
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a 
essência, minha alma tem pressa...
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente 
humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta
com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não 
foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos lizados, 
e deseja tão somente andar ao lado do que é justo.

Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, desfrutar desse
amor absolutamente sem fraudes, nunca será perda de tempo.
O essencial faz a vida valer a pena.


O texto original foi publicado
In, “Creio, mas tenho Dúvidas”,
Editora Ultimato, MG - Brasil
© Ricardo Gondim
E o original pode ser lido no site:
http://www.ricardogondim.com.br/

Portanto, na esperança de que seja feita justiça, esse texto
não é da autoria de MÁRIO DE ANDRADE ou RUBEM ALVES
como circula na internet.


3 de fev. de 2011



33.

Nuno de Figueiredo


Porque agora o que mais nos inquieta
nesta funda ravina onde de rastos
o corpo declinamos suportamos onde o
canto dos pássaros se apresta ao exílio
capaz deste deserto porque agora

aquilo que nos faz voltar os olhos
e não ver além das cores o branco e
o silêncio além da música do sangue
pelos troncos e do frio nos ramos e 
nas sebes que ornam o tempo ano a ano

aquilo que agora nos acode é sermos
a voz única que grava nesta pedra
os sítios da memória os rituais
da espera porque agora reparamos e
nos frutos sentimos já os dentes com

a nova revolta chamada talvez resignação
porque temos é forçoso de aceitar que a
estação que vivemos agora e se eterniza
não é mais do que a única estação.


© Nuno de Figueiredo
In, A Única Estação
edições quasi
Portugal